terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ocultismo Na Formação do Nazismo

O Nazismo ainda hoje surpreende pela capacidade que teve de hipnotizar e catalizar todas as forças da sociedade alemã a tal ponto que conseguiu chegar até onde chegou.
Neste interessantíssimo documentário da Discovery Channel, é estudado a importância que Hitler e seus ministros deram à mitologia e ao ocultismo como ferramenta na criação e propagação de suas idéias.
Apresento aqui uma PlayList de vídeos que encontrei no YouTube. Você também pode ver a PlayList através da minha conta.
Espero que aproveite.

A Incrível Paródia do Walt Disney sobre o Nazismo.

Veja que interessante. Quando agente pensa que não sabe de nada e não viu nada, aparece alguma coisa nova e diz que é muito pior do que isso.
Eu já comentei aqui que sou fanático por história. Ouço, leio e assisto tudo o que encontro ou chega até mim que se relacione a história. É lógico que a história do Holocausto e do nazismo me chamam muito a atenção, e já lí inúmeros materiais, assisti a dezenas de filmes e centenas de documentários a respeiro, seja em português, espanhol, inglês (ainda que não entenda tudo) e hebraico.
Porém em mais de vinte e seis anos de leituras de tudo o que se pode imaginar, jamais em minha vida soube que Walt Disney havia produzido desenhos parodiando a Alemanha Nazista de Hitler em plena Segunda Grande Guerra.
Dando meus passeios pelo YouTube, de maneira não intencional achei este curta metragem da Disney, onde aparece uma paródia musical do nazismo com ninguém menos que Pato Donald.  Vale a pena assistir.
Esse Curta foi premiado com o Oscar de melhor Curta Metragem de Animação em 43/44.
Parabéns para a criatividade e o humor dos gringos!

domingo, 27 de dezembro de 2009

Frase do Dia

“Para tudo é preciso apenas um homem em crise, inteligente e ativo, com iniciativa para devotar toda sua energia nisso, não importando o processo, nem todos os obstáculos no caminho. Em todo novo invento, em todo passo, mesmo o menor deles, o processo necessita ter um pioneiro, quem lidera o caminho sem deixar nenhuma possibilidade de voltar atrás”.

                                                                                                     Eliezer Ben-Yehuda.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Uma Surpresa interessante!

Costumo, logo depois que anoitece, sair pra fazer a minha "Caminhada Notúrnica". Saio de minha casa, vou em direção ao zoológico (ChaiPark), sigo no sentido do Tsomêt Afeq, atravesso a Derech Acko, sigo em direção ao Beit Qvarot, passo pelo antigo Zôo de Bialik, Parpar até a Dafná e aí direto até a Ben Gurion. Então subo de volta até a Derech Acko, atravesso e desço a Weitzmann até a Hashmonaim... quase chegando em casa novamente.
Até aí são mais ou menos 7800 metros, que percorro em mais ou menos uma hora. Quando chego nesse ponto, já estou todo suado e com as pernas doendo um pouco pelo esforço, porque não faço Caminhada suave, mas Caminhada Acelerada. Poucos metros antes de chegar na Hashmonaim, quando ia passando pela Tahanat Ótubus (ponto de ônibus), me deparo com uma grande quantidade de livros "jogados" no canto da calçada, entre o passadiço e a cerca-viva.
Normalmente teria vergonha, mas em se tratando de livros, não podia fazer outra coisa a não ser parar e verificar do que se tratava.
Para minha surpresa eram duas enciclopédias "Junior", uma Britânica e a outra não conhecida. Ambas em hebraico. Pensei como levá-las pra casa, pois era bastante volume e pesado. Na esquina ao lado havia uma quitanda que estava fechando. Corrí até lá e pedi uma sacolinha plástica, que serveria pelo menos pra facilitar um pouco o transporte.
Neste trecho da caminhada eu não estou muito longe de casa. Somente tenho que entrar por umas "vielas" que cruzam as quadras e ruas até chegar na minha casa. Com o cansaço que eu já tinha pela caminhada, mas o peso dos livros, cheguei em casa quase morto, mas feliz! Mas isto não era tudo. Havia os outros livros que ficaram lá, e tive que voltar no mesmo pé, agora com a minha mochila, pra recolher o restante. Estava preocupado se alguém poderia ter recolhido os livros, mas pra minha boa sorte, ainda estavam lá. Ah! quem vai pegar livros!

De volta a casa, pude ver bem do que se tratava. Uma Enciclopédia Britânica Junior incompleta (de encadernação azul) e uma Enciclopédia para o Adolescente Israelí (de edição israelense e o melhor de tudo, em hebraico fonetizado, o que facilita muitíssimo a leitura). O legal dessa segunda Enciclopédia é que ela foi editada e impressa em 1975, mesmo ano do meu nascimento. Temos a mesma idade e apesar de estarmos separados tanto tempo, vimos nos encontrar 34 anos depois que nascemos.
Abaixo, seguem as fotos da minha descoberta.


quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

O Sagrado Templo de Jerusalém - בית המקדש

Nos meus passeios e devaneios pela rede, acabo encontrando e descobrindo coisas super interessantes ( e que me custam um tempo danado! Fica difícil de levantar até pra fazer xixi!)
Eu estava vendo os meus e-mails no hotmail e acabei me deparando com uma chamada do MSN que me cativou a atenção. Tentei dar uma espiada, mas ao abrir a página, o msn me informava que aquele site estava vetado (por motivos comerciais) para a região de registro do meu PC, ou seja, pro Oriente Médio. Legal!
Fiquei com uma raiva danada e pensei como poderia acessar o site. Em internet é assim, nada é impossível, só tem que saber como fazer. Como não sou especialista em nada ( e odeio informática - como trabalho, não como usuário) nem adiantava tentar algum "contrl abc" que não ia dar em nada. Em linguagem de programação eu sou A-N-A-L-F-A-B-E-T-O!
Então, me restava o caminho dos ignorântes da web como eu, pesquisar. Afinal de contas o ícone da década dos anos 2000 não foi a queda das torres, mas acredito que foi a "janela"! ou seja, os ícones de navegação. Até um cego (perdoem-me pelo políticamente incorreto paralelo) consegue navegar e descobrir coisas na net com as "janelinhas" ou "ícones" inventados, roubados, disseminados pelo Bill.
Pois bem, entrei no YouTube (Santo Padroeiro da Ladroada Virtual) e digitei o nome do documentário que o MSN rabugento não me deixou ver. Rá! La estava ele, dividido em nove partes, e para meu "orgasmo do conhecimento e da curiosidade" ainda "dublado" na verborragia crônica aguda de Camões!
Porém este é assunto para um outro post, porque envolve um tema pra lá de complicado, e agora estou com fome e tenho que preparar o almoço. Resumindo: NÃO TENHO TEMPO AGORA!.
Mas, depois de ver o vídeo, resolvi dar uma sapeada no Santo Padroeiro dos Curiosos - o Google. Afinal de contas, nunca é bom acreditar na mentira de um só mentiroso. Quantos mais mentirosos, melhor a mentira.
Depois de algumas "ondinhas" e "marolas", acabei achando algo, "relacionado", mas distinto.E é isso que quero postar aqui.
Achei um site legal, em espanhol -Ahhhhhhhhhhhhh! Tudo bem, eu sei que não é igual ao português, mas melhor do que gringolês ou hebraico, não é mesmo? (perro: cachorro, saco: paletó, concha: orgão sexual femino, puto: não é prostituto ou alguém com raiva, é viado, e Casa Rosada não é onde mora a Pantera Cor de Rosa, mas é o palácio dos Argentinos!Rá!
Voltando, o site que eu encontrei é o site do Instituto Para A Reconstrução do Templo, em Jerusalém.
Se você gosta de história, arqueologia e religião, dá uma olhadinha lá. Tem umas fotos interessantes.
Fica a dica. Mais tarde eu volto!
Blz...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Será que tenho algo a esconder?

Uns dias atrás recebi no blog o comentário do Camilo. Ele é de Portugal e disse mais ou menos o seguinte. Que eu deveria deixar os comentários em aberto, e não fazer a moderação para posterior publicação. Querendo provocar, ele disse que achava que eu tinha algo a esconder, e essa era a impressão que passava por não deixar os comentários livres.
Pois bem, em primeiro lugar, agradeço ao Camilo que além de visitar o blog também se deu ao trabalho de deixar um recado com o que ele acha. Valeu, Camilo!
Em segundo, gostaria de explicar (ainda que não necessitasse dar satisfações) o porque da moderação. Quem trabalha ou se diverte com assuntos judaicos e relativos a Israel na web sabe muito bem que o que mais acontece, são os ataques dos neonazistas. Como eles não tem mais nada pra fazer na vida, eles vivem na rede buscando assuntos ligados ao judaismo pra depois meter o pau, chingando, falando bobagens e repetindo a velha ladainha deles. Como eu não gosto (e acho que estou neste direito) dessa palhaçada toda, prefiro moderar os comentários, e assim evitar esse tipo de sujeira.
Terceiro, vem a questão de que possivelmente eu esconda algo. Pergunta retórica: "Será que na verdade, todos ( e digo TODOS) sempre não temos algo a esconder? Um pensamento, um desejo, um julgamento crítico, algo que fizemos no passado e queremos ouvidar, etc.... Pelo menos pessoalmente, não acho que uma pessoa deva ser escrava de seu passado ou do que já fez, pensou, acreditou e todo mundo poderia um dia esconder algo pra viver em paz, consigo e com os demais ao seu redor.
Talvez eu tenha sido um assassino! Ou ainda um ladrão e fugi com uma pequena fortuna! Essa até não é uma má idéia. Muita gente aqui em Israel ia gostar de pensar assim, afinal já faz um tempão que eu não trabalho, só estudo e o pessoal fica se perguntando, como é que eu vivo! Ou eu tenha "tido um caso com a mulher de um traficante", e pra não amanhecer comendo grama pela raíz, tive que fugir do Brasil pra Israel. São tantas as possibilidades... mas tenho que reconhecer a mais difícil delas. Infelizmente sou Sionista! e pra piorar tudo, de Direita! Sei que hoje no mundo isso quase equivale a um palavrão, mas fazer o que. Essa é a verdade que tentei esconder, mas não posso mais. Tenho que dizer ao mundo: SOU SIONISTA!
Pronto, já falei. Agora não tenho mais nada que esconder, mas vou continuar moderando os comentários.
Shalom uLehitraot!


As Belas Gurias Guerreiras do Exército de Israel!

Eu tava aqui, tentando pensar em alguma coisa que fosse interessante pra postar. Daí me lembrei de algo pra mais de interessante. As Gurias do exército. E que gurias!
Tenho um amigo, e ele até já é casado, que sempre fala como fica louco quando vê as gurias de uniforme. E ai eu pergunto, quem não fica!?
Bom, deixa de blá, blá, blá... e vamos ao que interessa. No YouTube encontrei esse vídeo com fotografia de muitas, muitas gurias. Umas muito bonitas, outras nem tanto... vai do gosto de cada um...


segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Chanucá já Acabou!...


    Primeiro dia de Chanuká, onde se acende somente o "shamash" e a primeira vela.

Puxa vida! Como o tempo passa rápido.
Me lembro como se fosse hoje, tava comentando com um amigo que o outono já havia chegado. Era 21 de setembro, e a temperatura começava a baixar por aqui, pelos lados do Oriente Médio. Os dias estavam agradáveis, e as noites já começavam a esfriar. Tive que tirar uma manta de lã (presente de minha avó quando fiz minha aliá) para não passar frio durante a noite.
Pois bém, o tempo passou, e passou rápido e já chegamos a 21 de dezembro. Não sei se do ponto de vista astronômico hoje realmente é o dia do equinócio de inverno, mas pelo menos oficialmente (na folhinha), sempre foi. Quando via as "hadashot" agora a noite, a repórter comentou que estamos a 10 dias do fim do ano segundo o calendário "luazi", ou seja, do ano gregoriano. Apesar de não ter importância cultural em Israel, a passagem do ano laico é importante do ponto de vista comercial, porque as empresas, fábricas e negócios precisam se equiparar com seus sócios, fornecedores e filiais no resto do mundo. E como no mundo todo o ano comercial termina em dezembro e começa em janeiro, nós aqui em Israel não temos outra alternativa a não ser respeitar dois anos novos por ano, o nosso religioso judaico, e o ocidental, para questões financeiras.
De qualquer maneira dia 31/12 e 01/01 são dias normais e corriqueiros. Se não fosse pelo número de russos bêbados caídos pelas ruas e parques ( um grande número de russos comemora o ano novo, que me parece ser uma mistura de ano novo com natal e que eles chamam de Silvester), agente nem perceberia.
Os árabes cristãos também fazem um pouco de barulho, mas como as comunidades sempre estão bem isoladas umas das outras, também não vemos nada. Somente lá em Haifa, na cidade baixa, que possui uma comunidade grande de árabes cristãos e várias igrejas, se pode perceber pelas luzes, enfeites e árvores de natal que realmente estamos nesta época.

     Oitavo e último dia de Chanuká. Acendemos o "Shamash"(extrema esquerda) e as oito velas.


Pra mim, fica a saudade das sufganiot (espécie de pãozinho frito e recheado com geléia e coberto com açucar - no Brasil é chamado de sonho) e das levivot (bolinhos de batata com ervas fritos em óleo de oliva) e das velas da Chanukiá, que nos acompanharam durante oito dias e nos ajudaram a lembrar dos milagres que nosso D´s já fez por nós, e a reconhecer os milagres que ainda acontecem.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Cada Um Tem Seus Mortos.


      O título deste post pode parecer um pouco estranho, mórbido, mas logo se entenderá o porque.
Dia 17/12 foi o dia da haskaráh (aniversário de falecimento) do meu avô materno. Segundo nosso costume, o costume judaico, nesse dia acendemos uma vela de 24 h para que ela seja o sinal entre nós (os vivos) e D´s de que não esquecemos nossos mortos e mesmo depois desta separação física, continuamos respeitando o mandamento de "honrar pai e mãe" através da nossa lembrança e recordação.
Os mais religiosos também cumprem vários atos neste dia com o intuito de recordar seus falecidos. Durante a reza no Beit Knésset, aquele que está realizando uma haskaráh costuma recitar o Kadish (reza da santificação do Nome de D´s) dos Enlutados, nas três rezas do dia. Há muitas congregações e tradições que também permitem ao "enlutado" também ofereça uma refeição, ou um pequeno "banquete" em memória do falecido. Assim, o nome daquele ente querido é recordado num momento de alegria e regozijo, e sempre reconhecendo o juízo divino como infalível e justo, afinal sempre cremos que tudo ocorre segundo a vontade ou a permissão de D´s!
Por uma série de fatores eu somente acendi a vela de 24 h pela memória de meu avô, sem cumprir todas as demais tradições, mas o mais importante é que permiti a mim mesmo recordar esse nobre homem que permitiu, de maneira indireta, que eu estivesse aqui hoje.
Meu avô era de horigem judaica pela mãe e italiano pelo pai. Como era costume entre os latinos naquela época, ele levava somente o nome do pai, Lifôncio. Chamava-se Nérico Lifôncio. Por parte de mãe, tinha o mesmo sobrenome da família da minha avó, Hätchuel ou como eles o pronunciavam, Rochuel.
Meu avô era filho único e sua mãe faleceu quando ele ainda era criança. Assim ele teve uma infância muito difícil, muito sofrida, já que muitos pais naquela época não estavam preparados para assumir uma paternidade sozinhos.
Eu não me recordo exatamente como as coisas se passaram para ele, mas me parece que ele foi sendo criado pela parentela, um pouco numa casa, um pouco noutra, e sempre tendo que trabalhar duro, desde muito cedo para "pagar" pela comida e pela estadia.




Neste vídeo você pode ver imagens da região onde meus avós viviam e onde eu passei quase que todas as minhas férias e feriados escolares. Um paraíso!



De modo geral, a vida não era nada fácil naqueles tempos, ainda mais para eles, que haviam optado por viver longe das grandes cidades, nos campos, da agricultura e da criação de pequenos animais. O trabalho era pesado e a necessidade de ter que fazê-lo não respeitava chuva, sol, frio, calor ou os perigos que a densa mata atlântica oferecia.
Assim meu avô foi crescendo, um homem terrívelmente honesto e reto, mas sem saber e conhecer o que era o afeto, o toque, o amor, o carinho. Ele somente sabia fazer uma coisa, trabalhar.
Lembro-me de uma vez em que ele, já bastante idoso, teve que tratar de uma galinha que estava entrando em "choco", e eles não queriam. O problema é que quando as galinhas entram em choco, elas ficam violentas, ou "brabas". Todos nós morríamos de medo da galinha e quando meu avô viu que ninguém se encorajava a fazer o trabalho, ele se aproxima do ninho, enfia  a mão por debaixo da galinha e a segura pelos pés para tirá-la de lá, no que ao tentar se defender, a galinha lhe bica as costas da mão, arrancando pedaços de pele. Meu avô, impassível, segue seu trabalho, amarra os pés da galinha e a entrega para minha avó. Nós, os netos, estávamos estarrecidos e chocados pelos ferimentos na mão dele, mas ele dizia que não sentia nada e não tinha dor. Hoje eu sei perfeitamente que lhe doia muito, mas era um homem que tinha se acostumado com a dor e o sofrimento.
Mas se meu avô era assim frio e rude, não era porque fosse um homem mau, mas simplesmente ele não conheceu outra maneira de ser. Ele dava ao demais o que ele havia recebido. Mas mesmo ele sabia, as vezes, expressar um mínimo de afeto.
Praticamente todas as minhas férias foram passadas com meus avós. Eles tinham uma grande propriedade numa cidade do interior do litoral sul paulista. Uma cidade que ainda hoje é pequena, mas naquela época era minúscula. Todos se conheciam e tudo era muito perto. Meu avô, como produtor, era conhecido de todos os comerciantes da cidade e por eles sempre muito bem tratado. A fama de homem honesto, reto e trabalhador que não se envolvia em confusões já lhe permitia regalias. Recordo-me de uma das tantas vezes em que ele me pôs sobre a garupa de sua bicicleta e fomos ao centro da cidade. Por todos os comércios que passávamos me era oferecido doces, balas e bebidas. Quando não era uma "oferta da casa", meu avô la me comprava, e eu era feliz!
Seu Nérico era um homem muito inteligente. Sabia carpintaria, todas as tecnicas de plantio, ferramenteiro, construtor, artesão e como não podia deixar de ser naquela época, pescador e caçador. Com  ele aprendi a pescar, plantar, beneficiar diversos produtos do campo, construir ferramentas e móveis e atirar. No alto das paredes das casas de meus avós, sempre haviam muitas espingardas. Umas pequenas e fracas (para os passarinhos) e outras pesadas e fortes (para a defesa e a caça de animais grandes). Ainda me recordo como se fora ontem, quando dei o meu primeiro tiro, auxiliado pelo meu avô, contra um tronco de árvore. Depois aprendi a recarregar os cartuchos, com pólvora, papel, chumbo e mais papel ou cera para selar. Trabalho perigoso.
Mas, bem antes disso, a meu avô gostava me pôr sentado sobre seus tornozelos e me balançar pra frente e pra trás cantando uma antiga melodia que dizia "serra, serra, serrador, serra o papo do vovô". E assim eu era feliz!
Agora um pouco de seu lado mais difícil. Seu Nérico era um homem duro, de uma moral antiga e dura, inflexível e patriarcal. Ele acreditava que sua autoridade era absoluta e inquestionável, e seu relacionamento com os filhos nos anos 60 foi difícil e desgastante.
Logo depois dos meus quatro anos, meu avô adoeceu gravemente, nunca mais vindo se recuperar. Aí ele se torna uma pessoa amarga e desgostosa. Para ele era inaceitável não trabalhar, não ocupar-se dos negócios, depender de terceiros... e com o tempo ele foi morrendo, mais pelo desgosto do que pela doença em si.
Depois de longos e sofridos tratamentos e internações, chegou um dia em que ele regeitou receber medicação e tratamento. Os médicos tentaram obrigá-lo e pediram a minha avó que o convencesse a mudar de atitude. Mas quem poderia dobrar aquele homem que tinha a vontade moldada nas mais difíceis lições e sofrimentos da vida? Sua aparência dava impressão de debilidade, mas a força de vontade ainda era tão grande e forte quanto nos tempos em que enfrentara a mata, os rios, animais selvagens, o calor do verão ou o frio do inverno em campo aberto. E foi assim. Se negou em receber tratamento, para, segundo ele, morrer com a pouquíssima dignidade que ainda le retava. Foi uma questão de dias, e minha avó recebeu o comunicado ainda de madrugada de que Seu Nérico tinha falecido.
17 de dezembro de 1987. Eu tinha 12 anos, e porquê estava viajando, distante, não pude acompanhar o sepultamento.
Mesmo assim, depois disso, todos os anos, pelos próximos 10 anos, acompanhei minha avó ao cemitério para render homenagem a esse homem, duro, enérgico, "brabo", mas de um valor e uma honestidade imensurável. Foi um homem correto a tal ponto que em um casamento de mais de cinquenta anos, nunca houve sequer rumores de aventuras ou coisas parecidas por parte dele. Sempre que viajava a negócios, a Santos, e tinha que quedar-se mais de um dia, fazia questão de levar um filho ou filha para o acompanhar e assim jamais pudessem falar algo contra seu nome. Sempre dizia que era melhor emprestar do que pedir emprestado e que o homem que levanta cedo não pede pão na casa do vizinho.
E assim foi. A casa dos meus avós sempre foi uma casa respeitada, bem falada e um lugar onde sempre os mais necessitados e apurados tinham onde encotrar auxílio.
Nosso contato foi pouco, mas pude aprender muito com meu avô. Que D´s cuide de sua alma. Amén!

 Nérico Hätchuel Lifôncio ז"ל
27 kislev 5748

Imagens dessa Mata Atlântica que meus avós tanta amaram e admiraram.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Aprendendo a Morrer... Uma Nova Lição de Vida!

 
 Este post é um reportagem da Revista Época, da Colunista Eliane Brum. Eu já postei uma vez um outro texto dela, e se o faço é porque acredito que os textos dela são muito bons, de uma sensibilidade e relevância que fogem bastante a média.
Eu, como pensador (desculpem-me se ao me auto-definir assim ofendo a alguém!) sempre procurei observar tudo ao meu redor através de uma visão crítica ( entenda-se por analítica, mais do que acusatória), para desta forma entender o porque das coisas e mais importante ainda, saber se eu deveria compartilha-las. Afinal de contas, não gosto muito da idéia de que  posso estar vivendo como um novilho numa manada que lentamente caminha, espontâneamente, para o matadouro (consumismo, alienação, uso de entorpecentes, promíscuidade, e tantas outras maneiras de alienar-se). 
E, numa sociedade onde se valoriza somente o Belo (do ponto de vista helenístico), a Morte passou a ser um tabu, algo profundamente rejeitado e evitado em todos os seus aspectos. 
Lembro-me que quando menino, numa das tantas conversas ao redor do fogão de lenha da casa de minha avó, eu fiquei sabendo que além dos meus tios vivos, minha avó tinha tido outros cinco filhos, todos mortos durante seus primeiros anos de vida. Cinco! E não que ela não sofresse com isso, mas ela aceitava como parte natural da vida. Para a  gente daquela geração, viver e morrer eram verbos que possuiam um mesmo valor. Era natural. E tinha que ser, porque assim como hoje, apesar de toda a tecnologia e conhecimento que possuímos, a morte é algo inevitável, que para todos nós virá um dia, tão certamente como o sol nasce no oriente.
E porque é importante pensar e entender a morte e o seu processo? Porque a morte põe um limite, um fim, um ponto final a nossa existência. Se é assim, então devemos, talvez, pensar em como agir, o que fazer, o que é de verdade relevante para nós e para aqueles que amamos e que nos rodeiam. Porque não viveremos para sempre e um dia tudo cessará. Para morrermos com valor, precisamos antes de mais nada, viver valorosamente! 
Bom texto.
 
 
O homem que me ensinou a morrer.
 
Conheça a incrível história de Valentim de Moura, o operário que morreu passarinhando.
ELIANE BRUM
 
 O mais fascinante da profissão de repórter, na minha opinião, é a possibilidade de bater na porta de tantas vidas e ter uma boa desculpa para entrar. Isso, às vezes, tem um preço alto. Mas, em outras, como na história que vou contar, é um presente. Fui convidada a participar do Profissão Repórter, da TV Globo, sobre a enfermaria de cuidados paliativos do Hospital do Servidor Público Estadual, em São Paulo. O programa foi ao ar nesta terça-feira (15) e pode ser visto neste site. Ao gravar a minha parte, conheci um homem extraordinário chamado Valentim de Moura.

Durante mais de uma semana, acompanhei seu Valentim na vivência de sua morte. Nestes tempos estranhos que vivemos, em que a morte é um tabu, o mais radical é morrer com serenidade, sem medo. Por absurdo que pareça, morrer com naturalidade tornou-se um ato revolucionário. Foi assim com seu Valentim: ele encerrou sua vida em paz. Para ele, não havia nada mais natural do que chegar ao fim de sua trajetória e morrer cercado por quem amava contando histórias da sua vida.

Nós, repórteres, sempre sofremos com as histórias que apuramos e não couberam no texto – ou, neste caso, no programa de TV. Trabalhamos limitados pelo número de páginas, pelo tempo do programa. A história de seu Valentim não pôde ser contada. O inusitado ali era a naturalidade da morte. E o fato de uma morte serena ser algo tão subversivo me fez pensar bastante.Como estes acontecimentos ficaram tatuados na minha alma, quis contar aqui para que mais gente pudesse ter a chance de aprender com seu Valentim. Não queria me beneficiar sozinha de uma experiência de vida tão larga.
 
Ele sabia que morreria de câncer. Era tratado na enfermaria de cuidados paliativos, um lugar onde cuidar é mais importante do que curar. Lá, doentes com escassas chances de cura são acompanhados por profissionais da saúde com uma convicção diferente da difundida pela prática médica tradicional. Eles acreditam que seu papel é amenizar os sintomas, escutar muito, cuidar das feridas invisíveis para que os pacientes possam viver intensamente, até o fim. A vida não é nem abreviada, nem prolongada por tratamentos dolorosos e invasivos. Cada paciente é visto como a pessoa singular que é, e sua história é tão determinante na hora de tomar as decisões quanto os aspectos médicos.

Durante o tratamento, seu Valentim piorava e passava alguns dias internado na enfermaria, até estar bem e voltar para casa. Quando novamente piorava, voltava para o hospital. Até o dia em que sentiu que, quando voltasse à enfermaria novamente, não mais retornaria para casa. Reuniu a mulher, dona Geralda, os seis filhos, e pediu que lhe comprassem um túmulo. Queria que fosse branco, mas os filhos acharam que sujaria muito. Concordaram então em pintar da cor do céu. Ele pediu também que plantassem muitas flores no jardim. Seu Valentim pertencia à natureza.

Quando o túmulo ficou pronto, ele anunciou que havia chegado a sua hora. “Minha casa agora vai ser esta nova que vocês fizeram para mim”, disse. “Quero ir para aquela enfermaria cheia de moças bonitas, onde me tratam muito bem.”

No caminho, exigiu uma parada no cemitério. Vistoriou seu túmulo, seu jardim, e disse: “Muito bonito”. Entrou no carro satisfeito e foi para o hospital. Lá, contou-me que era metalúrgico e, como o presidente Lula, também teve o dedo engolido por uma máquina. De dentro do lençol, puxou uma mão magra para mostrar-me a ausência que marcava sua vida de operário. Ao lado, o cunhado lembrava dos tempos em que seu Valentim tocava sanfona e havia se apaixonado por dona Geralda. Enquanto ele morria, ouvia histórias. Em todas, era ele o protagonista.

A cada dia seu Valentim ia nos deixando um pouco mais. Mas sem pressa. Nenhuma. “O tempo é o dele”, disse a chefe da enfermaria, Maria Goretti Maciel. “Não temos nenhuma necessidade de intervir. Ele está vivendo o fim da vida. E o médico não deve se intrometer nisso. Só precisamos caminhar ao lado dele, para ajudar no que for preciso. Este é um caminho que tem de ser vivido.” Logo depois, com aquele jeito manso de Goretti, ela suspirou: “Não parece a morte que a gente gostaria de ter?”

Parecia. Desrespeitamos tanto o tempo na nossa vida, não esperamos o tempo de nada, atropelamos o tempo de tudo, não temos nem sequer minutos para elaborar os tantos acontecimentos vividos. Que pelo menos esperemos o tempo da morte. Resolvi até sentar-me um pouco no corredor para gastar tempo refletindo sobre o tempo sem me preocupar em gravar coisa alguma.
 
Nos últimos dias seu Valentim não falava mais. Só olhava, para longe e para dentro, na mais absoluta serenidade. Parecia que às vezes ele mesmo se surpreendia de acordar e ainda estar neste mundo. Já tinha deixado a casa que construiu, despedido-se da família que criou com dona Geralda, falado de amor para a mulher com quem viveu 45 anos. Estava pronto para ir embora.

Numa manhã, partiu. “Passarinhando”, resumiu Goretti. Simplesmente parou de respirar, silenciou e se foi.

No dia seguinte foi enterrado em um cemitário chamado Saudade, acompanhado pela mulher, os filhos, os netos, os colegas de trabalho, os companheiros de sanfona, os amigos de uma vida inteira. Foi um enterro do jeito dele. Enquanto o cortejo evoluía pelo cemitério, eu escutei mais meia dúzia de histórias do seu Valentim. Quando todo mundo se calou por um instante, soubemos que dezenas, talvez centenas de passarinhos moravam nas árvores perto de seu túmulo.

Ao me despedir de dona Geralda, descobri porque aquele casamento tinha dado tão certo. Ela disse, depois de dar adeus ao homem com quem tinha dividido a maior porção da vida: “Ele está bem guardadinho ali no barraquinho dele”. Estava mesmo. E estava tudo certo.

Em um vídeo, que mostramos aqui, há uma pequena amostra do material gravado com seu Valentim. Dá para ter uma ideia deste homem e sua morte tão subversiva para os tempos atuais. Dizem que nome é destino. Às vezes, como agora, até acredito.
Se seu Valentim soube morrer sem drama, eu também quero me despedir dele sem choro. Só quero dizer: “Muito obrigada, seu Valentim, por me ensinar a morrer”.

(Eliane Brum escreve regularmente às segundas-feiras. Esta é uma edição especial.)
 
 
 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Chanuká, a Festa da Luzes!

Pois bém, estamos no meio da Festa Chanuká ( o Ch lê-se como um R de Rua) e é nosso dever (de todo judeu e judia maior) de acender durante oito dias, uma vela cada dia na Chanukiá (candelabro de oito braços), para "divulgarmos" o milagre de Chanuká, quando o azeite da lâmpada do Candelabro do Templo, que era suficiente para somente um dia, durou oito! Como o Templo tinha sido profanado pelos helenistas, foi necessário uma purificação e não havia azeite puro para poder acender a Menorá. Somente para um dia. Mas milagrosamente, esse azeite durou oito dias, tempo suficiente para se preparar mais azeite puro (santo) para manter a Menorá acesa.
Porém esse não foi o único milagre deste evento. Em Chanuká se comemora a vitória dos Revoltosos Macabeus (Judeus) contra a dominação Grego-Assíria. O maior problema dessa dominação era a falta de liberdade Religiosa, e mais do que isso, a pressão dos Gregos para que todos os judeus se convertessem ao Helenismo. Assim, inicia-se a revolta dos Macabeus, que apesar de comparavelmente inferiores em número, em força e principalmente em experiência de guerra, conseguem expulsar o invasor, recobrando o domínio político e a liberdade de culto do Judaísmo.
Rav Kock, um dos pais do Sionismo Religioso, faz um belo comentário sobre a festa de Chanuká. Ele pergunta porque do dever de cada judeu acender uma vela nesta festividade. Sua explicação é a seguinte. Cada homem (mulher, criança, idoso... ) tem uma luz dentro de si e cada um de nós tem a obrigação de tirar essa luz que levamos dentro de nós e com ela iluminar o mundo. É isso que simboliza o ato de acender as velas em Chanuká.
Chanukát Sameach a todos, desde Israel!

Como sempre, um vídeo pra enriquecer o audio-visual. São as maravilhas do século 57 (Vocês não queriam que eu escrevesse aqui o século greco-romano XXI, né? Em homenagem a Chanuca, coloquei o século do calendário judaico, quinquagésimo sétimo século). É uma animação de massinhas, muito legal. Amador, mas muito bom. Tenha paciência de ouvir a música até o final, porque o melhor vem depois! Aproveitem.
P.S. O vídeo é Made in Brazil, por isso tá em Português!


terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O Canto Ladino na Tradição dos Judeus Sefaraditas

Aqui nesta playlist, montei com vídeos do YouTube uma coleção legal e diversificada de Música da Tradição Sefaradita (Espanhola). Como nós, os sefaradim, fomos expulsos da Espanha em 1492, tivemos que nos dirigir a outros países do Mediterrâneo, da Europa e muitos foram para o Novo Mundo. Nos vídeos abaixo, poderão ver tradições sefaradí do Marrocos, da Grécia, da Turkia, da França, e tantos outros.


segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Os Judeus e o Prêmio Nobel*

Ao todo, 152 personalidades judaicas já receberam o Prêmio Nobel desde 1901.


N.E.: Esta matéria foi escrita provavelmente em 2004, estando assim bem desatualizada com relação aos números.


Desde seu lançamento, em 1901, o Prêmio Nobel foi conferido a 700 personalidades – 152 delas judeus. É uma estatística que impressiona: os judeus são, hoje um grupo de quase 13 milhões para o Escritório Central de Estatísticas de Israel, 14 milhões para a Enciclopédia Britânica de 1999 e cerca 16 milhões para outras fontes, num planeta habitado por 6 bilhões de pessoas. Mas são os responsáveis por grande parte das grandes novidades científicas e dos avanços na medicina no mundo todo, deste e do século passado.
Ao todo, já receberam o Prêmio Nobel de Literatura 12 judeus, o Nobel da Paz outros 9 judeus, o de Química 25, incluindo os dois israelenses deste ano, Avram Hershko e Aaron Ciechanover, o de Economia 15, o de Medicina, a impressionante quantidade de 50 judeus e a expressiva do de Física 41. Outros israelenses que já receberam o Nobel foram, em 1978, o então primeiro-ministro Menahem Begin, que dividiu o Nobel da Paz com o presidente egípcio Anuar Sadat; em 1994, o ministro das Relações Exteriores, Shimon Peres, e o primeiro-ministro Yitzhak Rabin, com o Nobel da Paz. E, em 1966, Shmuel Yosef Agnon conquistou o Nobel de Literatura com a escritora sueca Nelly Sachs, também judia.
Um livro divulgado no Reino Unido, preparado por um advogado de Nova York – Michael Shapiro – atiçou ainda mais a mística sobre uma suposta inteligência apurada dos judeus.
Depois de fazer pesquisas com filósofos, rabinos, escritores, cientistas, Shapiro produziu a lista dos cem mais importantes judeus. Nela, estão alguns dos maiores pensadores e criadores da humanidade. Moldaram o que pensamos e até como nos vestimos.
Afinal, existe algum segredo?
O livro já começou a receber críticas antes mesmo de ser publicado. A polêmica começa logo no topo da lista. O vencedor, em primeiro lugar, é Moisés, libertador dos judeus escravizados do Egito e, mais importante, divulgador dos Dez Mandamentos que orientaram os limites da ação humana civilizada.
Ficou em segundo lugar Jesus. Perdeu porque seu nome teria sido usado e abusado para servir em massacres, perseguições e intolerância: a Inquisição, por exemplo.
A lista tem vários consensos. Karl Marx, Sigmund Freud, pai da psicanálise e Albert Einstein, pai da física. Além disso, fazem companhia Levi-Strauss, criador da calça jeans, a peça de roupa mais usada no mundo e Steven Spielberg.
Mais unanimidade: Abraão, criador do conceito do monoteísmo, absorvido pelo islamismo, catolicismo e protestantismo. Num dos maus célebres símbolos de rebeldia, ele destruiu estátuas de deuses.
Abraão está junto de dois americanos, conta Shapiro, Jerry Siegel e Joe Shster, criadores do Super-Homem. O próprio Super-Homem, conta Shapiro, seria “judeu”, batizado com o nome hebraico “Kalel”, antes de chegar à Terra. Uma invenção de marketing para atacar o anti-semitismo que reinava nos EUA.
Como um povo tão pequeno, consegue gerar tantos super-homens intelectuais?
O segredo é que não existe segredo.
Por motivos religiosos, o analfabetismo é inexistente entre os judeus. Aos 13 anos, o menino é obrigado a subir ao púlpito e ler trechos do Livro Sagrado (Bar-Mitzvá). Portanto, ele deve saber ao menos uma língua. Os judeus são ensinados a reverenciar a rebeldia intelectual – rebeldia sintetizada em Abraão, ao destruir os deuses e inaugurar o monoteísmo.
Nenhum povo foi tão perseguido e humilhado por tanto tempo como os judeus, o que gerou uma série de efeitos colaterais. Um deles é o valor da Educação para a sobrevivência. Podem arrancar suas terras, propriedades, mas não o que está em sua cabeça.
Alfabetização universal, rebeldia e reverência à educação como arma de sobrevivência – são a base fundamental, mas não explicam os super-homens intelectuais. Eles tiveram que ser dotados de extraordinária inteligência e, não menos importante, viver no lugar certo na hora certa. Desenvolveram suas idéias nas cidades iluminadas culturalmente, centros de debate e reflexões.
Ou seja, não existe nenhum segredo dos judeus escondido na genética ou escolha Divina. Apenas o óbvio: Culto à Educação. É uma característica de todo e qualquer ser inovador, seja branco, negro, amarelo, homem ou mulher. Ou de qualquer país que progride.
Em situações normais, sem perseguição, os judeus trabalham e conseguem empregos como qualquer outra pessoa. Em Nova York, um judeu ficou famoso e mereceu uma reportagem do The New York Times, simplesmente porque era mendigo.

Judeus com Nobel:


Literatura:1910 - Paul Heyse, 1927 - Henri Bérgson, 1958 - Boris Pasternak, 1966 - Shmuel Yosef Agnon, 1966 - Nelly Sachs, 1976 - Saul Bellow, 1978 - Isaac Bashevis Singer, 1981 - Elias Canetti, 1987 - Joseph Brodsky, 1991 - Nadine Gordimer, 2002 – Imre Kertesz e 2004 - Elfriede Jelinek.


Paz: 1911 - Alfred Fried, 1911 - Tobias Michael Carel Asser, 1968 - Rene Cassin, 1973 - Henry Kissinger, 1978 - Menachem Begin, 1986 - Elie Wiesel ,1994 - Shimon Peres e Yitzhak Rabin e 1995 – Joseph Rotblat.


Química: 1905 - Adolph Von Baeyer, 1906 - Henri Moissan, 1910 - Otto Wallach, 1915 - Richard Willstaetter, 1918 - Fritz Haber, 1943 - George Charles de Hevesy, 1961 - Melvin Calvin, 1962 - Max Ferdinand Perutz, 1972 - William Howard Stein, 1977 - Ilya Prigogine
1979 - Herbert Charles Brown, 1980 - Paul Berg e Walter Gilbert, 1981 - Roald Hoffmann,
1982 - Aaron Klug, 1985 - Albert A. Hauptman e Jerome Karle, 1986 - Dudley R. Herschbach, 1988 - Robert Huber, 1989 - Sidney Altman, 1992 - Rudolph Marcus, 1998 – Walter Kohn, 2000 - Alan J. Heeger, 2004 - Avram Hershko e Aaron Ciechanover.


Economia: 1970 - Paul Anthony Samuelson, 1971 - Simon Kuznets,1972 - Kenneth Joseph Arrow, 1975 - Leonid Kantorovich, 1976 - Milton Friedman, 1978 - Herbert A. Simon, 1980 - Lawrence Robert Klein, 1985 - Franco Modigliani, 1987 - Robert M. Solow
1990 - Harry Markowitz e Merton Miller, 1992 - Gary Becker, 1993 - Rober Fogel, 1994 – John C. Harsanyi e 2002 – Daniel Kahneman.


Medicina: 1908 - Elie Metchnikoff, 1908 - Paul Erlich, 1914 - Robert Barany, 1922 - Otto Meyerhof, 1930 - Karl Landsteiner, 1931 - Otto Warburg, 1936 - Otto Loewi, 1944 - Joseph Erlanger e Herbert Spencer Gasser, 1945 - Ernst Boris Chain, 1946 - Hermann Joseph Muller, 1950 - Tadeus Reichstein, 1952 - Selman Abraham Waksman, 1953 - Hans Krebs e Fritz Albert Lipmann, 1958 - Joshua Lederberg, 1959 - Arthur Kornberg, 1964 - Konrad Bloch, 1965 - Francois Jacob e Andre Lwoff, 1967 - George Wald, 1968 - Marshall W. Nirenberg, 1969 - Salvador Luria, 1970 - Julius Axelrod, 1970 - Sir Bernard Katz, 1972 - Gerald Maurice Edelman, 1975 - David Baltimore e Howard Martin Temin, 1976 - Baruch S. Blumberg, 1977 - Rosalyn Sussman Yalow e Andrew V. Schally, 1978 - Daniel Nathans, 1980 - Baruj Benacerraf, 1984 - Cesar Milstein, 1985 - Michael Stuart Brown e Joseph L. Goldstein, 1986 - Stanley Cohen e Rita Levi-Montalcini, 1988 - Gertrude Elion,
1989 - Harold Varmus, 1991 - Erwin Neher e Bert Sakmann, 1993 - Richard J. Roberts e
Phillip Sharp, 1994 - Alfred Gilman e Martin Rodbell, 1995 - Edward B. Lewis, 1997 - Stanley B. Prusiner, 2000 - Eric R. Kandel e 2002 - H. Robert Horvitz.


Física: 1907 - Albert Abraham Michelson, 1908 - Gabriel Lippmann, 1921 - Albert Einstein
1922 - Niels Bohr, 1925 - James Franck, 1925 - Gustav Hertz, 1943 - Gustav Stern, 1944 - Isidor Issac Rabi, 1952 - Felix Bloch, 1954 - Max Born,1958 - Igor Tamm, 1959 - Emilio Segre, 1960 - Donald A. Glaser, 1961 - Robert Hofstadter, 1962 - Lev Davidovich Landau
1965 - Richard Phillips Feynman e Julian Schwinger,1969 - Murray Gell-Mann,1971 - Dennis Gabor,1973 - Brian David Josephson,1975 - Benjamin Mottleson, 1976 - Burton Richter, 1978 - Arno Allan Penzias e Peter L Kapitza, 1979 - Stephen Weinberg e Sheldon Glashow, 1988 - Leon Lederman, Melvin Schwartz e Jack Steinberger, 1990 - Jerome Friedman, 1992 - Georges Charpak,1995 - Martin Perl, 1995 - Frederik Reines,
1996 - Douglas D. Osheroff e David M. Lee, 1997 - Claude Cohen-Tannoudji,1999 - Martinus J. Godefriedus Veltman, 2002 - Raymond Davis, 2003 - Vitaly Ginzburg, 2004 - David J. Gross e David Politzer.

Fonte: Visão Judaica, número 26.


sábado, 12 de dezembro de 2009

Uma das canções mais linda que eu já ouvi!

Sempre fui um romântico incorrigível. Uma pena, porque apesar das mulheres dizerem que gostam de homens românticos, elas em geral preferem os brutos (principalmente os com bom nível de estupidez! E se não acreditam em mim, é só ver o nível das reclamações das casadas e das separadas!). Também sou um apaixonado por idiomas. Falo além do português, espanhol (e bem, sem falsa modéstia), hebraico; estudei japonês, entendo razoavelmente italiano e francês e estou começando dar meus passeios (noturnos e de alcova, diga-se de passagem...) pelo idioma russo!
Porém, a mais bela de todas, a mais romântica, a mais lírica, doce de todas é sem dúvida nenhuma, o italiano. Para mim pelo menos. Por isso vou postar aqui um exemplo dessa minha paixão. Um casamento perfeito - Roberto Carlos cantando em italiano! Segue o vídeo, que tirei é claro do YouTube* e a letra, que peguei emprestado de um excelente blog (Roberto Carlos Internacional).

*Se alguém tiver interesse, tenho uma playlist de músicas italianas com o Roberto Carlos no YouTube. É só clicar aqui!

Video e Música : (Me desculpem o vídeo que não tem nada a ver. É um vídeo pessoal de alguém, mas eu não achei algo melhor).



Letra em italiano:

Io ti propongo (Proposta) - 1975
- Roberto Carlos - Erasmo Carlos (versão: C. Malgioglio)

Io ti propongo
Restiamo insieme
Non andare via
Lasciati amare
Fammi tremare
Lasciati andare

Io ti propongo
Di darme il corpo
Dopo l'amore il mio conforto
E a questo punto
Le prospettive
Che me chiedi tu

Come tu vedi
Io sono preso
Per te confuso
E ti confeso
Chè non a caso
Tormento solo me

Io ti propongo
Restiamo insieme
Saremo pazzi
L'uno dell'altro
E insoddisfatto
Deluso Io
Non sarò mai
No, non sarò mai

Io ti propongo
Di darme il corpo
Dopo l'amore il mio conforto
E a questo punto
Le prospettive
Che me chiedi tu

Come tu vedi
Io sono preso
Per te confuso
E ti confeso
Chè non a caso
Tormento solo me

Io ti propongo
Restiamo insieme
Saremo pazzi
L'uno dell'altro
E insoddisfatto
Deluso Io
Non sarò mai
No, non sarò mai

Io ti propongo...

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O depressivo na contramão





O que a depressão pode nos dizer sobre o mundo em que vivemos?

Eliane Brum (Colunista da Revista Época)






Em seu último livro, O Tempo e o Cão – a atualidade das depressões (Boitempo, 2009), a psicanalista Maria Rita Kehl nos provoca com uma hipótese sobre a qual vale a pena pensar: a depressão, que vem se tornando uma epidemia mundial desde os anos 70, pode ser a versão contemporânea do mal-estar na civilização. Ela teria algo a dizer sobre a forma como estamos vivendo e sobre os valores da nossa época. Para além da patologia, a depressão pode ser vista também como um sintoma social.

O que nossa época nos exige? Euforia, confiança, velocidade. Temos de ser pró-ativos. O que ela nos promete? Se soubermos traçar nossas metas e construir nossa estratégia, atingiremos o sucesso. Se produzirmos e consumirmos, alcançaremos a felicidade. Ser feliz deixou de ser uma possibilidade esporádica para se tornar uma obrigação permanente. Para nós, seres desta época, nada menos que o gozo pleno. Fora disso, só o fracasso. E o fracasso, este é sempre pessoal. Se não alcançamos o que nos prometeram no final do arco-íris é porque cometemos algum erro no caminho. E fracassar, como sabemos, passou a ser não um fato inerente à vida, mas uma vergonha.

O depressivo, neste contexto, é a voz dissonante. É o cara na contramão atrapalhando o tráfego, como na letra de Chico Buarque. Como diz Maria Rita, é aquele “que desafina o coro dos contentes”. Ela afirma, logo no início do livro: “Analisar as depressões como uma das expressões do sintoma social contemporâneo significa supor que os depressivos constituam, em seu silêncio e em seu recolhimento, um grupo tão ruidoso quanto foram as histéricas no século XIX. A depressão é a expressão do mal-estar que faz água e ameaça afundar a nau dos bem-adaptados ao século da velocidade, da euforia prêt-à-porter, da saúde, do exibicionismo e, como já se tornou chavão, do consumo desenfreado”.

Neste sentido, a mera existência do depressivo aponta, nas palavras da psicanalista, a má notícia que ninguém quer saber. Se basta ser pró-ativo, bem-sucedido e saudável, por que tantos e cada vez mais, como mostram as estatísticas, são classificados como depressivos?

“A depressão”, diz Maria Rita, “é sintoma social porque desfaz, lenta e silenciosamente, a teia de sentidos e de crenças que sustenta e ordena a vida social desta primeira década do século XXI. Por isso mesmo, os depressivos, além de se sentirem na contramão do seu tempo, vêem sua solidão agravar-se em função do desprestígio social da sua tristeza”.

Cada época cria seus proscritos. Na época da euforia e da velocidade, nada mais desafinado do que um depressivo. Se, em vez de hoje, o depressivo, então chamado de melancólico, vivesse no romantismo do final do século XVIII, “estaria tão adequado à cultura e aos valores de sua época quanto um perverso hospedado no castelo do marquês de Sade”.

Hoje, porém, os depressivos parecem ser não só o portador de uma má notícia, mas de uma doença contagiosa. Quem quer ter por perto alguém que sofre em um mundo cuja existência só se justifica pelo sucesso e pela felicidade plena? Num mundo em que todos têm de estar “de bem com a vida” para merecer companhia?

O depressivo não apenas sofre, mas silencia num mundo em que as pessoas preenchem todos os espaços com sua voz. E não apenas silencia, mas em vez de preencher seu tempo com dezenas de tarefas, uma agenda cheia, se amontoa no sofá da sala e nada quer fazer. Não só é lento, como chega a ser imóvel. Sua mera existência nega todos os valores propagandeados dia após dia ao redor de nós – e também pelo nosso próprio discurso afirmativo e de auto-convencimento.

Ao existir, o depressivo faz uma resistência política passiva ao establishment. Obviamente, ele não é um ativista nem tem consciência disso e preferiria não sofrer tanto. O que Maria Rita nos propõe é enxergar a depressão para além dos aspectos clínicos. Enxergar também como sintoma da sociedade em que vivemos. Como a ótima psicanalista que é, o que ela nos propõe é ouvir. Neste caso, ouvir o que a depressão tem a nos dizer quando escutada como sintoma social, como expressão de um mal-estar no mundo.

Os medicamentos podem fazer enorme diferença nas depressões graves num primeiro momento, para arrancar da apatia e possibilitar uma elaboração dessa dor que permita lidar com a vida de uma forma menos paralisante. Inclusive para romper com o imobilismo e buscar uma escuta pela psicoterapia ou pela psicanálise. Os medicamentos antidepressivos têm sua hora, seu lugar e sua importância. Mas acreditar que a medicação resolve tudo é calar a dor de quem a vive. E, no âmbito social, é ignorar o que ela diz sobre o que há de torto em nosso mundo.

Afirmar que a indústria farmacêutica resolve tudo é silenciar o impossível de ser silenciado, como prova a escalada das estatísticas da depressão. Na esfera social, significa dizer que é uma ótima vida correr desde que acorda até a hora de dormir, sem ter um minuto sequer para elaborar o que de bom e de ruim viveu naquele dia. Sem tempo para viver a experiência. Ou, como diz Maria Rita, vivendo no tempo do Outro.

Acreditar que a epidemia mundial de depressão pode ser erradicada com pílulas é afirmar que no nosso mundo nada falta. E um pouco mais grave que isso: é acreditar não apenas que é possível atingir uma vida em que nada falte, como atingi-la é uma mera questão de adaptação, pró-atividade e saúde.

No âmbito do indivíduo, tratar a depressão apenas com medicamentos é tornar ilegítima a sua dor. É dizer ao depressivo que o que ele sente não merece ser ouvido porque é produto apenas de uma disfunção bioquímica. É reforçar a crença de que o depressivo não tem nada a dizer sequer sobre ele mesmo. É cristalizar o estigma. Sem contar que tentar calar os sintomas da depressão à custa de remédios leva ao embotamento da experiência, ao esvaziamento da subjetividade. O que se sente é silenciado – e não elaborado. E, ainda que alguém achasse que vale a pena se anestesiar da condição humana, o efeito do remédio, como bem sabemos, é temporário.

Para algumas pessoas, encontrar médicos que resolvem tudo apenas com pílulas vai ao encontro de suas próprias crenças – e de sua necessidade de proteção. É mais fácil acreditar ser vítimas de uma doença, uma disfunção que está fora deles, a pensar que é um pouco mais complexo e mais difícil de lidar do que isso. É mais fácil do que aceitar que ele, como sujeito psíquico, está implicado neste mal-estar. Eu tomo remédio e não preciso pensar que algo me incomoda. Eu engulo uma pílula e não preciso lidar com a inadequação que me faz sofrer.

É possível compreender que, para quem já está na contramão do mundo e é visto muitas vezes como um estorvo, ajuda não ter ainda mais essa “culpa”. Tranqüiliza pensar que aquela dor que está sempre ali foi causada por uma disfunção involuntária dos neurotransmissores. E que pode ser resolvida com um comprimido.

O problema é que a realidade mostra que não é tão simples assim. Quem já fez tratamento com antidepressivos sabe que “curar” uma depressão não é o mesmo que tratar de uma micose ou mesmo de uma pneumonia. Não basta tomar remédio: é preciso expressar a dor, é necessário elaborar o sofrimento e, em geral, mudar a vida ou a forma de olhar para a vida e para si mesmo.

Ao conversar com minha filha, também psicanalista, sobre esse tema, ela fez um comentário que cabe neste contexto. “É curioso como os filmes de ficção científica sempre usaram aquela imagem terrorífica de seres humanos levando uma injeção na nuca e se tornando embotados. Isso era assustador e nos assustava”, disse. “Agora, o que assustava passou a ser a vontade das pessoas. Elas querem tomar uma pílula, ou uma injeção na nuca, e ficar embotadas.”

Maria Rita sugere que vale a pena para todos – e não apenas para os depressivos – pensar o que a depressão está nos dizendo sobre nosso mundo. É isto ou continuar assistindo, impotentes, ao crescimento da epidemia, que atinge não apenas adultos, mas adolescentes e crianças, cada vez mais cedo. É preciso prestar atenção nesse mal-estar no mundo, escutá-lo, de verdade e com verdade, sem cair nos contos de fadas contemporâneos que transformam todos os monstros em déficits bioquímicos. Ao contrário de todas as profecias, a indústria farmacêutica não vai nos salvar de uma vida sem vida.

O livro de Maria Rita Kehl é complexo e vai muito além destas minhas primeiras interpretações. Uma das questões mais originais é a relação entre a depressão e o tempo. O depressivo seria também aquele que se recusa a se inserir no tempo do Outro. O nome do livro – O Tempo e o Cão – vem da experiência pessoal da psicanalista, ao atropelar um cachorro na estrada. Ela viu o cachorro, mas a velocidade em que estava a impedia de parar ou desviar completamente dele. Conseguiu apenas não matá-lo. Logo, o animal, cambaleando rumo ao acostamento, ficou para trás no espelho retrovisor.

É isso o que acontece com as nossas experiências na velocidade ditada pela nossa época. Diz Maria Rita: “Mal nos damos conta dela, a banal velocidade da vida, até que algum mau encontro venha revelar a sua face mortífera. Mortífera não apenas contra a vida do corpo, em casos extremos, mas também contra a delicadeza inegociável da vida psíquica. (...) Seu esquecimento (do cão) se somaria ao apagamento de milhares de outras percepções instantâneas às quais nos limitamos a reagir rapidamente para em seguida, com igual rapidez, esquecê-las. (...) Do mau encontro que poderia ter acabado com a vida daquele cão, resultou uma ligeira mancha escura no meu pára-choque. (...) O acidente da estrada me fez refletir a respeito da relação entre as depressões e a experiência do tempo, que na contemporaneidade praticamente se resume à experiência da velocidade”.

Por coincidência, estava zapeando na TV ontem à noite (domingo), quando encontrei a psicanalista no Café Filosófico da TV Cultura, um dos melhores programas da TV aberta. Lá, ela fez algumas considerações muito interessantes. Anotei duas delas para acrescentar a esta coluna. “Nos dizem que ‘tempo é dinheiro’. Ora, tempo não é dinheiro. Dizer que tempo é dinheiro é uma violência”, afirmou Maria Rita. “Tempo é o tecido de nossas vidas”. E um pouco mais adiante: “Em qualquer sociedade, o poder se instaura por alguma forma de controle do tempo”.

Quem quiser ler o livro de Maria Rita Kehl precisa saber que é um livro difícil. Não se lê fácil como uma daquelas obras de auto-ajuda. Exige tempo, parada, reflexão. Para quem é leigo, é preciso ler e reler alguns trechos, voltar. Talvez até pular algumas partes que, depois de ler e voltar e reler, ainda assim não alcançamos. Mas vale todo o esforço.

Aprendi algo sobre isso, na semana passada, ao ouvir Benjamin Moser, autor da recém-lançada (e excelente!) Clarice, (CosacNaify, 2009), uma biografia de Clarice Lispector. Ele contou que os livros que mais gosta da escritora são os mais difíceis, aqueles que teve de ler para escrever a biografia, e não os primeiros que leu e compreendeu de imediato. Então, disse algo mais ou menos assim: “Os escritores têm de nos alcançar, mas nós também temos de alcançar os escritores”.

Achei genial. E acho que é isso. Vale a pena essa busca para alcançar alguns escritores e suas vozes a princípio obscuras. Alcançar alguém é sempre uma experiência rica – e intransferível. O livro de Maria Rita Kehl, assim como os livros mais estranhos de Clarice Lispector, vale porque ao final deste esforço há uma voz original, dissonante de todas as mesmices que ouvimos – e eventualmente repetimos.

Para mim, que acordo todos os dias – e especialmente na segunda-feira – pensando em como não sentir mal-estar em um mundo tão brutal, que exige uma velocidade que me rouba a vida, fez todo o sentido. Só consigo viver por que a cada dia minha questão crucial não é me adaptar a um tempo que não é o meu. Mas encontrar formas de me recusar a viver segundo valores que para mim não fazem sentido. É esta busca – e esta insubordinação – que me mantém em pé, ainda que cambaleando, às vezes, como o cachorro atropelado por Maria Rita, e até caindo, de tempos em tempos.

Dias atrás, ao conversar com meu amigo Toco Lenzi, um homem que como poucos recusa os valores e a velocidade desta época, ele me contou uma história de sua última passagem pelo Saara, na Mauritânia, que cabe aqui. Toco atravessa o Saara a pé, da Mauritânia a Tunísia, em etapas e sem nenhuma pressa, com nenhum outro objetivo além de viver a experiência de atravessar o Saara a pé. Eu o acompanhei na primeira parte desta jornada para escrever um livro que ainda está no começo.

Toco conheceu um tuaregue que havia deixado o Saara e vivido – muito bem – na Europa. Apesar do que teria sido considerado um sucesso pela maioria de nós, ele resolveu voltar ao deserto e ao antigo modo de vida. Toco perguntou a razão. Ele respondeu: "Vocês têm relógio, nós temos tempo".

Endereço original : http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI107441-15230,00.html

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O Fator X dos Judeus.


Cinquenta anos de petróleo e de ilimitados recursos, dezenas de países e milhões de cidadãos, não foram suficientes para dar um só Premio Nobel ao mundo. Cinquenta anos de Israel, com escassa população e recursos limitados, deram (ao mundo) mais de uma dezena.


Calmos, todos quietos. Que não se assuste Maruja Torres nem toda a corte dos que martelam os hereges israelenses e que habitam nas esquinas do dogmatismo progressista. Este artigo não vai ao Oriente Médio, talvez porque o verão, apesar de suas sombrias notícias, resiste a abandonar as boas intenções. Ademais, a persistente lógica perversa da maldade terrorista cai por seu próprio peso, mais além das tentativas que alguns têm em demonizar tudo o que cheira a ocidental, e perdoar paternalmente o que se cozinha nas montanhas onde cavalgam os novos Almanzor1. Em todo este denso e complexo conflito, entre uma ideologia niilista totalitária, com vocação imperial, e o código ético-político da modernidade, há os que são tão anti-ocidentais, que acabam sendo antimodernos. E por modernidade entendo os valores históricos que se consolidaram num modelo de sociedade livre. Para dizê-lo com um símile da própria colheita que me parece simpático: há os que vêem um padre católico e lhes sai um eczema, mas se vêem um imã nas montanhas do Líbano, têm um orgasmo. Imagine-se a histeria se vêem um rabino...

Dizia que o artigo era de outra coisa. Na quinta-feira passada, nesse edifício mágico de Puig i Cadafalch que hoje abriga a Casa Ásia, vivemos uma estranha e feliz tarde de verão. O professor de ciências políticas Xavier Torrens e Jaime Huberman, porta-voz da comunidade judaica Bet Shalom da Catalunha, convidaram-nos a refletir sobre o "fator X dos judeus", talvez inspirados por esse estimulante programa musical que faz sucesso no Quatro. Que fator cultural, religioso, histórico, inclusive até genético poderia explicar as surpreendentes cifras que rodeiam os inumeráveis escritores, pensadores, diretores de cinema, músicos, criadores de todo tipo que surgiram do povo judeu? Que um grupo humano que representa menos de 0,2% da população mundial tenha dado à humanidade mais de 20% dos prêmios Nobel, entre eles alguns dos últimos, está fora de toda estatística e, certamente, de toda lógica. Chaves na literatura mundial, com alguns eventos no século XX que marcaram a fogo gerações inteiras — com Marcel Proust à frente —,
também foi a contribuição judaica a que assentou as bases do pensamento moderno. A anedota resume isso de forma magnífica: um dia, um judeu subiu a montanha e, ao retornar, assegurou: "Deus é a verdade, e a verdade está na lei". Chamava-se Moisés. Séculos depois, outro judeu asseverou: "A verdade é Deus, e Deus é amor". Chamava-se Jesus. Depois apareceu outro que, sem amor divino, declarou que a verdade era o dinheiro. Era um tal de Karl Marx. Depois chegou Freud e situou a verdade algo mais abaixo do bolso, na parte crucial entre as pernas. E, para fechar o círculo, apareceu o judeu Einstein e varreu tudo: "A verdade é relativa". Nada da filosofia, da matemática, da física, da medicina, da literatura, da música, nada relevante no terreno do pensamento, da ciência e da criação pode-se explicar sem a extraordinária contribuição do povo judeu. E sempre foram muito poucos. E sempre foram perseguidos como ratos.

Fator X? Lá estávamos, numa sala cheia, com gente pelos corredores e o chão servindo de cadeiras, tentando dar resposta a um enigma particular. O historiador Joan Culla analisou a contribuição política, Xavier Torrens se atreveu com a criatividade, Vicenç Villatoro com a literatura, eu apurei algumas idéias sobre a contribuição ao pensamento, o rabino Ariel Edery batalhou com a superação na adversidade e, com a ajuda de Jaime Huberman, que nos acolheu nesse espaço de liberdade e cultura que são as pessoas do Bet Shalom, saíram algumas idéias apresentáveis. Este é o aperitivo de uma reflexão coletiva apaixonante e, com certeza impossível. O fator não é genético. No povo judeu há de tudo, como em todas as farmácias, desde cérebros brilhantes a gente de limitada ambição mental, mesmo que a porcentagem de gênios esteja fora de toda curva estatística. O fator não é religioso, já que parece que os deuses só iluminam os caminhos quando alguém acende as velas. Tampouco parece ser um fator histórico, ainda que a carga pesada de sua difícil história tenha conformado um instinto sobrenatural de superação. Xavier Torrens falou do valor do estudo. Não em vão, os judeus foram durante séculos, o único povo de nossa cultura que era alfabetizado. Mas também estudam os fundamentalistas do Paquistão, de maneira que o fator diferencial não é estudar, porém o que se estuda... Pessoalmente, situei a questão na singular cultura libertária e antidogmática de um povo que inclusive discute com seu próprio Deus, povo do livro, vinculado à palavra e à reflexão. Foram eles que, há milhares de anos, escreveram um código de leis que ainda marca as pautas atuais da convivência. E foi o rabino Edery quem selou a reflexão. Talvez o fator X seja a vida judaica, o conjunto de valores que caracterizam suas complexas amarras culturais, nas quais, a veneração pela vida, a superação individual e o compromisso com a cultura têm sido seu fato diferencial durante séculos. Sem dúvida, não é insignificante o esforço econômico que Israel dedica à pesquisa científica e médica — num país que se vê obrigado a gastar 60% de seus recursos com a defesa —, mas isso só explicaria o fenômeno nas últimas décadas. Que fique este dado para contra-argumentar alguns ódios: 50 anos de petróleo e recursos ilimitados, dezenas de países e milhões de pessoas, não deram um só prêmio Nobel ao mundo. 50 anos de Israel, com escassa população e recursos limitados, deram mais de uma dezena.

Este arti
go não pretende responder ao enigma, mas me pareceu interessante traçá-lo, inspirada por aquela feliz tarde de verão. E nem tanto para animar a busca das respostas, como para recordar que quando falamos dos judeus, falamos da cultura, do pensamento, da ciência. Nenhum povo contribuiu tanto sendo tão pequeno. Entretanto, o principal não é o agradecimento. O principal é repetir, insistentemente as maldades do preconceito e do desprezo.




Pilar Rahola: El País. Madrid
Tradução: Szyja Lorber

terça-feira, 6 de outubro de 2009

5770! Vai Ser Um Ano Abençoado!

Kiriat Motzkin, Haifa, litoral norte de Israel.
Agora, 19:20 h.
Estamos no meio da semana de Hag HaSucot, ou Festa das Cabanas. Como a maioria das festas do Calendário Judaico, Sucot também é uma festa que originalmente tinha um carater agrícola. Ela, além de seu significada e simbolísmo religioso, marcava e marca o fim do verão e o início do outono.
Por isso, agora, nesse instantante, esta chovendo!
A seguir um vídeo que gravei agora da janela do meu apartamento:





E o que há de tão importante nisto.
Pra quem vive no Brasil, pelo menos na parte do Centro Sul, deve parecer estranho o que eu vou dizer, mas aqui em Israel não chove durante todo o verão. E isso não ocorre porque haja uma seca ou estiagem, mas é este o processo natural da região. Entre abril e setembro não cai uma única gota de chuva em todo o país. Porém quando chega o inverno isso muda, e durante os próximos quatro a cinco meses, pode chover e muito.
Toda a agricultura e sobrevivência do país dependem destas chuvas. O Mar da Galiléia (Yam Kinéret), o rio Jordão, os poços de água espalhados pelo país, dependem única e exclusivamente destas chuva, que este ano começaram a cair bem cedo!
Só pra se ter uma idéia da importância da chuva pra nós, ontém foi um dia especial para rezar pelas chuvas deste ano em várias sinagogas espalhadas pelo norte do país! Esse é um ritual que se repete todos os anos, porque sempre há o temor de uma seca ou estiagem muito forte, que seriam devastadores para a economia e qualidade de vida no país!
Se bem que o abastecimento de água potável, em parte é produzido pelas modernas e gigantescas uzinas desanilizadoras. Hoje, Israel possui a mais avançada tecnologia de desalinização no mundo. Porém essa é uma água cara, que não pode ser usada para regar jardins, lavar ruas ou para a irrigação agrícola.
Assim, cada ano que passa, continuamos dependentes das Bençãos Divinas, que segundo o Tanach (a Bíblia), D´s, Bendito Seja o Seu Santo e Grande Nome, transmite em forma de chuvas!
Na sequencia, uma música que é como uma oração para que venham boas chuvas no outono!



segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Um Árabe que Ama o Hebraico! Surpreendente!

Vou colar aqui uma entrevista que um Poeta e Erudito Druso Israelense Nayim Araidy deu ao Professor Moacir Amâncio, professor de Literatura e Língua Hebraica da USP.


Sobre o infinito e a
língua hebraica
O poeta e professor de literatura Naim Araidy é o mais conhecido escritor árabe de língua hebraica. Nascido dois anos depois da criação do Estado judeu, ele mergulhou, na infância, nas águas profundas do idioma bíblico, embora em sua casa só se falasse árabe. Moacir Amâncio entrevistou-o, em sua aldeia natal


O professor e poeta Naim Araidy vive uma situação nova para um árabe druso, cidadão isralense, nascido na aldeia de Maghar em 1950, portanto dois anos após a independência do país. Sua língua materna foi evidentemente o árabe, mas esse idioma não seria o primeiro modo de expressão intelectual e artística usado por ele, e sim o hebraico. Hoje, é um professor conhecido em Israel, onde tem um programa de televisão, escreve em jornais, publica livros e ensina Literatura Hebraica na Universidade de Haifa. Sua tese de doutoramento, na Universidade Bar Ilan, provocou polêmica: o tema foi o poeta Uri Tzvi Grinberg, que era repudiado pelos trabalhistas pois o julgavam de extrema direita, e a direita tendia a valorizar nele pontos ideológicos com os quais concordava. E sua poesia, de alta qualidade, ficava de lado. Araidy tem como preocupação central a literatura e a busca de sua qualidade acima de todas as outras coisas. Conheci-o em Israel, no começo de 2007. Araidy vive uma situação parecida com a de Franz Kafka, que era judeu tcheco e escreveu em alemão. Não só com a de Franz Kafka, mas com a de muitos outros autores judeus que, na Europa e outros continentes, optaram pela escrita em outro idioma, inclusive o hebraico, e não o local, ou materno. A diferença óbvia está no fato de que Araidy não é judeu, pertence à religião drusa, mas preferiu usar o hebraico em sua literatura. Há outros árabes que escrevem em hebraico, mas, segundo ele, só dois autores o escolheram como idioma de expressão artística integral. Ele e o tradutor, poeta e romancista Anton Schammas, radicado nos Estados Unidos e, ao que parece, distanciado do hebraico, que o consagrou como escritor em Israel, país com o qual tem sérias divergências políticas.

A existência literária de Araidy e Schammas (há outros autores árabes que usam o hebraico, como Sayed Kashua e Salman Masal'ha) não deve ser vista como uma aberração. Pelo contrário. Do mesmo modo que se dizia que Israel só seria um país normal quando tivesse seus próprios ladrões e prostitutas, pode-se dizer que o idioma hebraico só recuperaria a normalidade quando passasse a ser língua de expressão plena, utilitária e artística, também para cidadãos de outras etnias que fazem parte da população israelense. A propósito de uma possível utopia pós-moderna com ecos cabalísticos do tikun, veja-se o poema intitulado "Sobre a pergunta por que eu escrevo em hebraico", aqui traduzido, com mais duas peças de sua autoria. Observe-se que, caso o leitor nada saiba da biografia de Araidy, não terá idéia de que se trata de um não-judeu. O que ocorre é um raro encontro de humanidades: o outro é o mesmo - haverá sentido político mais elevado que isso?

Araidy também escreve em árabe, mas, como conta, isso veio depois do hebraico. Nesta entrevista, montada a partir de declarações fornecidas por Araidy por correio eletrônico, entre uma visita a Pequim e participação no festival de poesia de Edinburgo, ele fala sobre sua relação de amor incondicional com o hebraico e com poesia.

Revista 18 Conte-nos um pouco sobre o que motiva sua poesia...

Naim Araidy Para mim é muito difícil a pergunta "por que escrevo poesia", no geral. Talvez seja uma questão de ego muito grande. Eu me coloco no centro, e as coisas que escrevo ficam como uma herança coletiva. Desejo que isso se transforme num modo de expressão para todas as pessoas, a partir da esperança, talvez do anseio de que as pessoas se encontrem nela, na minha escrita. Eu sinto, de repente, que não estou sozinho; como que livre do isolamento, ou exorcizado - como numa unicidade com o outro quando eu sou o centro, o mensageiro. E, portanto, isso de novo me devolve ao ego.


O professor e poeta Naim Araidy vive uma situação nova para um árabe druso, cidadão isralense, nascido na aldeia de Maghar em 1950, portanto dois anos após a independência do país. Sua língua materna foi evidentemente o árabe, mas esse idioma não seria o primeiro modo de expressão intelectual e artística usado por ele, e sim o hebraico. Hoje, é um professor conhecido em Israel, onde tem um programa de televisão, escreve em jornais, publica livros e ensina Literatura Hebraica na Universidade de Haifa. Sua tese de doutoramento, na Universidade Bar Ilan, provocou polêmica: o tema foi o poeta Uri Tzvi Grinberg, que era repudiado pelos trabalhistas pois o julgavam de extrema direita, e a direita tendia a valorizar nele pontos ideológicos com os quais concordava. E sua poesia, de alta qualidade, ficava de lado. Araidy tem como preocupação central a literatura e a busca de sua qualidade acima de todas as outras coisas. Conheci-o em Israel, no começo de 2007. Araidy vive uma situação parecida com a de Franz Kafka, que era judeu tcheco e escreveu em alemão. Não só com a de Franz Kafka, mas com a de muitos outros autores judeus que, na Europa e outros continentes, optaram pela escrita em outro idioma, inclusive o hebraico, e não o local, ou materno. A diferença óbvia está no fato de que Araidy não é judeu, pertence à religião drusa, mas preferiu usar o hebraico em sua literatura. Há outros árabes que escrevem em hebraico, mas, segundo ele, só dois autores o escolheram como idioma de expressão artística integral. Ele e o tradutor, poeta e romancista Anton Schammas, radicado nos Estados Unidos e, ao que parece, distanciado do hebraico, que o consagrou como escritor em Israel, país com o qual tem sérias divergências políticas.

A existência literária de Araidy e Schammas (há outros autores árabes que usam o hebraico, como Sayed Kashua e Salman Masal'ha) não deve ser vista como uma aberração. Pelo contrário. Do mesmo modo que se dizia que Israel só seria um país normal quando tivesse seus próprios ladrões e prostitutas, pode-se dizer que o idioma hebraico só recuperaria a normalidade quando passasse a ser língua de expressão plena, utilitária e artística, também para cidadãos de outras etnias que fazem parte da população israelense. A propósito de uma possível utopia pós-moderna com ecos cabalísticos do tikun, veja-se o poema intitulado "Sobre a pergunta por que eu escrevo em hebraico", aqui traduzido, com mais duas peças de sua autoria. Observe-se que, caso o leitor nada saiba da biografia de Araidy, não terá idéia de que se trata de um não-judeu. O que ocorre é um raro encontro de humanidades: o outro é o mesmo - haverá sentido político mais elevado que isso?

Araidy também escreve em árabe, mas, como conta, isso veio depois do hebraico. Nesta entrevista, montada a partir de declarações fornecidas por Araidy por correio eletrônico, entre uma visita a Pequim e participação no festival de poesia de Edinburgo, ele fala sobre sua relação de amor incondicional com o hebraico e com poesia.

Revista 18 Conte-nos um pouco sobre o que motiva sua poesia...

Naim Araidy Para mim é muito difícil a pergunta "por que escrevo poesia", no geral. Talvez seja uma questão de ego muito grande. Eu me coloco no centro, e as coisas que escrevo ficam como uma herança coletiva. Desejo que isso se transforme num modo de expressão para todas as pessoas, a partir da esperança, talvez do anseio de que as pessoas se encontrem nela, na minha escrita. Eu sinto, de repente, que não estou sozinho; como que livre do isolamento, ou exorcizado - como numa unicidade com o outro quando eu sou o centro, o mensageiro. E, portanto, isso de novo me devolve ao ego.

18 Quais são os temas principais de sua poesia?

NA Sobre o que eu escrevo? Escrevo sobre mim mesmo, sobre você, sobre todos nós, eu escrevo sobre coisas que não tenho outro modo de expressar; que estão fundo em mim. Sobre as coisas que mais me atemorizam; sobre os assuntos considerados irregulares, porque a norma os repele. Como um grito, pois tenho medo da morte e das doenças, da solidão e do sofrimento, da ausência do amor. Escrevo sobre assuntos que causam vergonha, porque estão fora do que é aceito, os valores e os comportamentos - como sobre minha vontade e minha capacidade de amar todo dia outra mulher; também nesta época em que passei da idade permitida, que me leva a fermentar tantas possibilidades. E eu escrevo sobre a beleza dolorosa que é ser um homem, no sentido amplo da palavra. Sobre o que é mais humano, sobre minhas fraquezas que são o medo, a solidão, o ciúme, o sofrimento e sobre a falta de piedade no mundo.

18 O que, em sua opinião, é uma característica própria da poesia?

NA A poesia é o modo de expressão para o humano que há em nós, e ela faz da dor humana algo belo, estético, para que possamos vivê-la de novo, numa forma renovada, aceita e bonita. A poesia é arte como a música, como o desenho e como a escultura. Mas uma arte mais tocante,dona de uma força sem igual. Ela não lida com as cores puras, com o som puro ou com a modelagem de material. O meio de expressão dela são as palavras, esta língua não é um meio técnico, por mais que seja belo e especial. A língua é um presente para o que está contido em toda a história humana, tanto a material quanto a espiritual, e ela inclui o mito, a religião e a filosofia, e, em função de sua própria essência, a poesia utiliza-se da língua e do que existe nela e do que é possível introduzir nela. Ela toca a língua, acaricia e cria com ela relações mais íntimas, e também sabe às vezes explorá-la, e ela precisa disso.

18 Parece que uma só língua não foi suficiente para o senhor...

NA A mim foi dado um privilégio que muitos não receberam. Escrever em dois idiomas, hebraico e árabe, sim, nessa ordem. Comecei com o hebraico e só depois com o árabe. No início, por causa de pressão; depois, por causa de amor e dedicação.

18 Não causa espanto o fato de alguém que tem uma língua tão difundida quanto o árabe optar por outra, tão reduzida em número de falantes?

NA O que fazer se eu sou árabe, druso e nasci no Estado de Israel, e tenho um pai que queria que seus filhos "fossem cultos como os judeus"? Ele me mandou para escolas judaicas. E eu assenti como quem é chamado à Torá. Como seria possível o contrário, com a vontade inamovível do pai árabe, druso, típico oriental, conforme a sociedade patriarcalista?

18 E como foi a sua iniciação na língua hebraica?

NA Nos primeiros dias de meus estudos na escola judaica, a senhora Steiner, a professora de Literatura Hebraica, me disse: "Escute menino! Com um hebraico assim você não pode agüentar a escola!" E a senhora Steiner não sabia em que estado de pânico me deixou. Acaso era possível voltar àquele pai e dizer a ele que eu não podia estudar lá? Aquele mesmo pai que enviara seu filho a fim de se instruir e voltar como médico para a aldeia? Quem sabe, talvez se satisfizesse também com um advogado, mas abaixo disso não havia o que dizer. Não podia voltar. Eu precisava enfrentar o medo tanto na expectativa da senhora Steiner quanto na de meu pai. A propósito, estranho que metade da nossa vida nós nos esforçamos para responder às expectativas dos pais, e a segunda metade nos esforçamos para responder às expectativas de nossos filhos. De um lado, é claro que não temos tempo para nós mesmos, e de outro lado, não nos livramos do temor diante da possibilidade de não sairmos nem daqui nem dali. Estranho quanto nós não pensamos sobre isso - e este ainda é assunto para poesia. E no final das contas, não estudei Medicina e de advocacia eu não gostava de jeito nenhum. No entanto, me transformei em professor de Literatura Hebraica e em criador na língua hebraica, com recepção bastante honrosa, mas não sem provo­cações tanto de um lado como do outro.

18 Poderia dar um exemplo de provocação?

NA Um dia, quando estudava na Universidade Bar Ilan, fiquei surpreso ao ouvir, justamente de um dos professores mais respeitados, que não acreditava que um criador pudesse escrever em língua que não a língua-mãe. A coisa me doeu, e então perguntei de modo desafiador o que dizer sobre os poetas judeus que escreveram em árabe na época pré-islâmica e na Idade Média, e que são considerados poetas bilíngües? E o que dizer sobre Ionesco, o romeno que é considerado um grande escritor francês? E o que dizer de Taher ben Jelloun, e o que dizer do escritor gigantesco que era judeu de origem tcheca que escreveu em alemão, que é Franz Kafka? O que dizer dos maiores da nova poesia hebraica cuja língua-mãe não era o hebraico?! E a lista não é curta. A mim foi dado o privilégio de escrever na língua sagrada, a língua do primeiro monoteísmo, que fundou o novo humanismo há cerca de cinco mil anos. Uma vez, visitou-me em casa um escritor quirguiz conhecido, que escreve em russo, Chingiz Aitmatov, e ele me perguntou como eu me sentia como um poeta árabe que escreve em hebraico. Respondi a ele de forma muito sofisticada: eu disse, "quando escrevo um poema de amor em hebraico, me sinto como o rei Salomão, e quando escrevo um poema de lamento, me sinto como o Rei David". E o sr. Aitmatov fez que sim com a cabeça, como se invejasse tudo o que eu podia escrever na língua sagrada.

18 Como o senhor vê o hebraico atual?

NA O novo hebraico é a continuação direta do hebraico bíblico. O idioma possui uma carga mitológica, social e espiritual e também estética que não é igual à de nenhuma outra língua. Essa língua sagrada, em outra de suas dimensões, confere àqueles que escrevem nela uma tradição completa de humanidade, protesto e perguntas, por mais duras que sejam, que são o dicionário de todo poeta verdadeiro. A humanidade que modelou nosso caráter humano começou com o profeta "pesado de boca" que tartamudeava (NR: Moisés, que era gago); veio com o rei que se apaixona e envia o marido de sua amada para ser morto a fim de ficar com a viúva. A mentira bem-intencionada do maior dos patriarcas. A história da Akedá, do sacrifício de Isaac, a esterilidade, as mulheres ciumentas e o que não? É realmente um privilégio escrever em hebraico.

18 E a escrita em árabe?

NA Falarei de modo resumido sobre a escrita em árabe. Apesar da riqueza dessa língua e da sua beleza e maleabilidade, há nela um grande problema, que é o conservadorismo que se apoiou na tese central do profeta do Islã, Mohammed. O profeta partiu contra a escrita de poesia porque a poesia se defronta com a alma humana e os problemas humanos, pois é ofício da religião ocupar-se deles. Ele argumentou que para cada poeta há um satã que lhe domina a escrita e isso é na essência uma heresia. Desde então houve um desvio na poesia árabe e esta dirigiu sua criatividade para a técnica verbal. Uma longa tradição e o conservadorismo como esse que se enraizou na consciência do público árabe tendem a repudiar qualquer mudança que tenha força para devolver a poesia à criatividade e ao enfrentamento com nossa humanidade. Contudo, ergueu-se um movimento muito importante, moderno e pós-moderno, que não renuncia à criatividade, apesar da oposição a isso. Eu me alinho com esse movimento.

Moacir Amâncio, professor de Língua e Literatura Hebraica da USP, é autor de Contar a Romã e Óbvio (poemas)

Escrever em hebraico e escrever hebraico

Escrever em hebraico significa utilizar o idioma em função dos meios de comunicação, somente. Quer dizer, aproveitar-se da língua técnica para determinadas necessidades. Seja para necessidades cotidianas, no supermercado, no escritório, no jornal, ou mesmo para a necessidade de expressar idéias e posições na imprensa, nos periódicos e também livros, como fazemos em Israel também os cidadãos árabes. Estes últimos cresceram no uso da língua hebraica quando parte deles tentou traduzir a história de suas vidas para a prosa, ou até traduzir suas emoções para poesias em hebraico, como toda tradução para outro idioma.

Mas escrever hebraico é outra coisa; poucos fazem isso entre os judeus, e há só dois casos entre os não-judeus. Um é Anton Schammas, que sumiu da arena e interrompeu sua escrita hebraica, por motivos políticos, porém sobretudo por motivos religiosos cristãos, ao lidar com uma temática cristã: extirpar o judaísmo da língua hebraica. O segundo sou eu.

Parece-me que a escrita hebraica não tem comparação com outras línguas tendo em vista sua origem tríplice, de povo, religião e idioma, conjuntamente. A língua carrega a etnia, a religião e a pátria, ainda quando esta última esteja ausente. Em determinadas épocas, ela continuou presente na língua. E com a inovação do estabelecimento do Estado de Israel e o fato de o idioma hebraico ter se tornado uma língua falada, não se extirparam dela aquelas três bases. A laicização da língua hebraica conferiu a ela uma dimensão midiática, mas não extirpou o judaísmo dela, sua judaicidade e sua identidade israelense.

A língua hebraica se engrandeceu, já nos primórdios de seu nascimento, quando criou o mundo e seu conteúdo, e o ordenou de acordo com critérios e princípios éticos dela. Ela criou mitos e os transformou em realidade. Chegou ao auge de sua força no Monte Sinai, lá se misturou à coluna de fogo que guarda sua brasa, como a sarça ardente que não é consumida, e quem olhar é ferido de morte, pois não O verá homem e viverá. Isso não existe em nenhuma outra língua.

E nessa língua está escrito o lamento mais belo da história da humanidade; está escrita a poesia de amor mais bonita da cultura humana, e Salomão esplendeu ao falar em seus provérbios até chegar ao auge dos auges, no Kohelet ben David (Eclesiastes).

Nada há de novo sob o sol, não poderá escrever hebraico quem não experimentou a dimensão do Monte Sinai, e quem não se identifica com a língua na sua condição triádica. Escrevem hebraico somente aqueles que se sentem interior e exteriormente dentro da profundeza dessa cultura, só quem é capaz de amá-la e de se sentir membro da casa dentro dela. Deve-se lembrar e distinguir, mil vezes, que é preciso fazer uma clara distinção entre quem escreve hebraico e quem escreve em hebraico.

Naim Araidy

Poemas

Tornei-me um homem mais equilibrado
Tornei-me um homem mais equilibrado
no passar dos quarenta em minha vida
eu digo
tornei-me um homem equilibrado.


Estranho
mais não poderei dizer:
talvez juntemos todas as pedras jogadas
nos montes de Jerusalém
para construir uma cidade outra
e não nos montes de Jerusalém.

Eu sou José
Eu sou José o sonhador
e a mulher de Potifar é só lenda
enfureci meus irmãos como é preciso
só em sonho
e não no dia-a-dia como se conta
amei a mulher de Potifar até o céu.
E sobrei
dentro do sonho.

Sobre a pergunta por que eu escrevo em hebraico
Para criar o mundo novamente
e as coisas sejam outras, veramente
outras, e ver que isso é bom.
E dar o mundo ao homem na bandeja
de ouro ou prata e fazer o mais que seja
preciso para trazer o bom e o melhor
a fim de que não comam os pais do verde, mas
do maduro. E anular, quanto possível for,
quem diz ser impossível dar a Deus
o que é de Deus e dar toda a mulher ao César.

E para escrever poemas sobre poesia não escrita
e elegias não sobre a morte, mas sobre o desperdício
da nova criação e não criar
o macho antes, primeira sempre a mulher.

Tradução de Moacir Amâncio